domingo, 17 de novembro de 2013

Laranjas de Henri para canibais



E assim mais um dia clareava, Henri se levantara, preparara seu café da manhã e logo iria até seu pomar colher laranjas. Henri era um homem solitário e afável. Afável com sua plantação de laranjas que era tudo o que possuía. Perdera os pais logo cedo, fora criado por sua tia Dolores que tentou ajudá-lo e compensar a perda da família.
Crescera isolado, sua tia era tão solitária quanto ele, não havia se casado, tampouco teve filhos. Logo que adquiriu maturidade Henri se mudara da casa da tia. A distância entre ele e a tia era glacial. A tia parecia viver distante dali, mas era muito boa para Henri.
Partira e começara nova vida nas montanhas da região, Henri gostava de mexer com a terra, sentia-se bem em meio às plantações da tia onde crescera e aprendera como adubar, plantar e cuidas das hortaliças. Levou consigo o gosto pela terra.
Refugiou-se em meio aos capinzais abandonados, adquiriu uma terra dita improdutiva e amaldiçoada. O antigo dono daquele lugar o alertou de que a terra era infértil e que não lhe renderia bons frutos.
Henri não se importara com o aviso e pensou consigo mesmo que tudo que aprendera aplicaria e que teria uma colheita fértil e abençoada. Exterminou os inços, limpou o terreno, plantou flores, limpou a velha cabana. Pronto, em poucos meses aquele lugar estava transformado, lindas flores cresceram, os pássaros começaram a se aproximar, borboletas voavam pelos céus da velha montanha esquecida que jazia efervescida até a chegada de Henri.
Henri investiu em uma belíssima plantação de laranjas, escolheu esta fruta por ser apreciador de seu sabor doce e cítrico. Mas algo lhe faltava. Henri era solitário desde a infância, queria ter uma boa companhia, mas as moças da região o achavam um tanto excêntrico e com isso se assustavam. Ele não era como os demais camponeses da região. Isso o deixava ainda mais isolado e solitário.
Henri vivia como um ermitão, seu companheiro era um gato, o único ser com quem Henri convivia. Henri era um leitor assíduo, acompanhava tudo o que se passava na região, no pais e no mundo, ele assinava jornais e revistas, adquiria livros, tinha gosto notável pela leitura. Isso fazia com que os camponeses locais o achassem ainda mais excêntrico, ora pensavam eles, um camponês, que vive isolado e planta laranjas cultivar o gosto pela leitura, e sim, somente por causa de Henri o carteiro subia a velha e ingrime montanha periculosa. Mas ele sentia falta de pessoas, na verdade ele queria uma vida normal, simples como a dos camponeses vizinhos que moravam na parte baixa da montanha. Como algo tão singelo poderia ser impossível a ele, refletia.
Henri amava ler, adorava a companhia do seu fiel gato, adorava cozinhar, aprendera diversos pratos com a tia Dolores. Ele não sentia falta de alguém para limpar, cozinhar e ou lavar seus trajes, mas sentia falta de ter alguém com quem pudesse dividir os seus dias, contar-lhes como passou, o que sentiu, como qualquer humano dito normal gostaria de assim ter uma companhia.
Uma destas manhãs gélidas, quando caia uma neblina Henri não iria ao pomar, preparou um chá e pensava em um meio de conhecer garotas, mas teria que ser de outro local. As moças dali não se interessavam por ele. Teve uma idéia, começou escrever cartas. Todas as segundas-feiras ele ia até o vilarejo e encaminhava uma carta a uma determinada donzela, na expectativa de ser correspondido. O tempo passou, numa destas manhãs uma surpresa para Henri, uma carta enviada a ele por uma jovem.
Apressadamente abriu e a leu, uma jovem o correspondera. No mesmo dia Henri retornou a carta. Assim passou mais um tempo até que ela veio visitá-lo.
Henri a esperava ansiosamente, ela viria de longe, e tudo o que ele imaginava é que agora teria uma noiva, uma companheira e amiga. Depois de longo tempo que mais parecia a eternidade, a eterna solidão e um grande vácuo em sua vida, finalmente ele tinha esperanças de que não mais seria um solitário.
Em menos de uma semana Helena chegaria ao mórbido vilarejo e seria conduzida por Henri até a velha cabana. Henri fizera uma grande limpeza fora e dentro da casa. Limpara o pátio, lavara tudo, e preparara um banquete para esperar sua futura amada.
Os dias e noites passaram brevemente e o grande dia chegou. Henri descera até o vilarejo para recepcioná-la na estação férrea. Ela chegaria de trem por volta das 16 horas de uma quinta-feira. Henri chegara à estação férrea com uma hora de antecedência, ficou por ali fazendo tempo, leu o jornal local, tomou uma caneca de café e esperou.
Finalmente o trem zumbiu em seus ouvidos, ela estava vindo pensou ele. Assim que o trem parou e as pessoas começavam descer, o coração de Henri parecia que saltaria de si. Helena fora uma das últimas passageiras a descer. Ele a conhecia por fotografia que ela enviara a ele em suas trocas de cartas. Finalmente ela surgiu e seus olhos brilharam. Ele ficara encantado com sua beleza, Helena era jovem com boa aparência, era fina e delicada aos seus olhos. As moças das redondezas não possuíam aqueles ares, aquela postura e delicadeza de Helena.
Henri lentamente aproximou-se da dama distinta apresentando-se, pedindo para carregar sua bagagem, convidou- a para um chá. Sentaram-se em um destes bares de estações ferroviárias, conversaram sobre a viagem enquanto degustavam o chá com bolachas e geleia. A jovem Helena pouco falava, mais ouvia, na verdade mais respondia às perguntas de Henri. Este estava estarrecido, como se estivesse sido congelado, não acreditava naquilo que seus olhos viam, mas tentava manter a calma e ser diplomático com a moça, também não queria assustá-la.
Depois do chá Henri pediu a um carroceiro que os levasse até o cume da montanha, e assim foi. Helena não dera um pio se quer, foi quieta durante todo o percurso, chegando lá Henri pagou o velho carroceiro e agradeceu-o pela gentileza de tê-los levado ao cume, nem todos aceitariam levá-los para casa devido a dificuldade de chegar ao local.
Henri pediu se Helena precisava de ajuda para desfazer a bagagem, então juntos arrumaram seus pertences em uma parte do armário de Henri que estava vazio esperando a chegada da moça. Depois disso caminharam pela montanha, Helena se encantou com a quantidade e variedade de aves que ali habitavam. As plantas também a deixaram perplexa por tamanha beleza e colorido que possuíam. Henri mostrou a montanha, o jardim, a horta, o seu fiél amigo gato, e por fim a plantação de laranjas.
Helena nunca tinha visto um laranjal tão extenso e bem cuidado como o de Henri, ele se defendeu dizendo que aquilo era a vida dele, amava tanto aquelas laranjas quanto sua mãe que morrera precocemente e além do mais tirava seu sustento dali, das laranjas.
A noite caiu, eles adentraram a velha cabana, enquanto helena se bahava, henri preparava uma sopa, fazia frio e este prato seria ideal para a noite. Em seguidam após Helena sair do banho, Henri foi tomar o seu. Jantaram, conversaram um pouco sobre a viagem, o dia, o passeio na montanha e deitaram-se. Henri ficara constrangido em aproximar-se de Helena, ela parecia educada mas arredia então dormiu no sofá da sala cedendo sua cama à dama que vinha de longe para vê-lo.
Na manhã seguinte Henri como de costume acordara cedo e preparara um saboroso café da manhã e levara para Helena, a jovem vislumbrou com aquele ato tão gentil de Henri, tomaram o café, ela semi deitada e ele na beirada da cama, posterior a isso Helena levantou, conversaram mias um pouco, sobre a noite e seus barulhos, dobre os sonhos e logo começavam os preparativos para o almoço.
A princípio tudo corria bem e amigável. Alguns dias passaram e tudo seguia igual. Uma noite Henri convidou Helena para fazerem uma fogueira, e contarem velhas histórias e lendas, a moça achou uma boa ideia. A noite caiu e Henri acendia as labaredas, logo em seguida sentaram-se ao redor do fogo, naquela noite fazia um frio considerável e o fogo foi muito útil para aquece-los, o gato estava ali presente, como que se ouvisse as histórias, horas e horas passaram, a neblina começara cair e eles resolveram entrar. A madrugada era convidativa para que dormissem juntos, ambos queriam mas nenhum tinha a devida coragem de tomar a iniciativa. Então como de costume Henri foi se encaminhando para o sofá e foi quando Helena o chamou para a cama alegando o frio. Henri nem pensou duas vezes e mudou-se para a cama rapidamente. E aquilo foi uma explosão inexplicável de amor e sexo e orgias, barbantes, arames farpados rosas e seus espinhos, velas respingando-lhes, tudo se transformou depois daquela fogueira que os aqueceu por completo invadindo seus corpos sedentos. Se acabaram naquela madrugada fazendo tudo o que lhe era permitido e não permitido.
O dia se fez, ambos se olhavam perdidos como dois estranhos. Mas com o passar das horas o clima de tensão foi se diluindo em reciprocidade dialógica.
O dia seguiu como de costume, laranjas, jardim, cortar a grama, cozinhar, lavar, se banhar, mas quando a noite chegava era como se um lobo uivasse no alto das montanhas e incendiava avelha cabana, os dois se terminavam literalmente falando. E assim foi por um tempo.
Mas Helena começara a sentir tédio, a mesma rotina, o mesmo lugar, tudo igual sempre e pediu a Henri que a levasse ao vilarejo. E assim foi, Henri fez a vontade de sua dama e a levara para passear na vila. Porém como ele tinha muitos afazeres nas montanhas deixava a jovem amada e subia para cuidar de suas laranjas que exigiam demais dele. E Henri disse a ela que pedisse para que um carroceiro a levasse pra casa quando enjoasse do passeio.
Pois assim foi, Helena passeou, comprou guloseimas fresquinhas da padaria, comprou flores, vinho e tomou o chá que era servido categoricamente as 17 horas, e por fim pediu a um carroceiro que passava por ali que a levasse até as montanhas.
Tudo certo até o momento que a carroça falhou e eles ficaram ali por um bom tempo esperando ajuda. Conversaram, comeram os quitutes e beberam o vinho. E depois disso saíram de si, e Dioniso se fez presente e já se imagina o restante da história. Muito além daquilo um outro carroceiro passava por ali, e os ajudou a consertar a carroça do homem e ele levou a dama até as montanhas.
Lá Henri esperava aflito pela sua companheira e agradeceu ao carroceiro por traze-la em casa, eles explicaram de modo muito dissimulado o porquê do atraso e o homem desceu a montanha. Henri e Helena conversaram sobre coisas triviais, tomaram um café acompanhado do jantar que Henri havia preparado para esperar a noiva e deitaram-se. Adormeceram tamanho era o cansaço de ambos, Henri exausto de trabalhar nas laranjas, Helena cansada devido à orgia cometida com o carroceiro. Helena dormia feito um bebê recém nascido e aconchegante junto da mãe, enquanto Henri pensava na história contada por ela e o carroceiro. Virava de um lado para o outro na cama e nada de dormir apesar do cansaço físico, levantou caminhara para lá e para cá, e Helena dormia um sono tão profundo que nem uma tempestade a acordaria. Henri sentou-se na poltrona e acariciava seu gato, deu-lhe um pouco de leite e saiu caminhar lá fora, olhava para o céu, para a lua que estava divina, era lua cheia e lhe ofuscava os olhos tamanho era seu brilho. Caminhou mais um pouco e foi até uma velha casinha onde guardava velharias, e encontrou o machado e entrou na cabana. Adentrou o quarto, apreciou por horas Helena dormindo, sua beleza, sua suavidade, sua pele de pêssego rosado e num golpe fatal a esquartejou em muitos pedaços. Em seguida cavocou vários buracos em sua plantação de laranjas e foi enterrando um a um.
Na próxima colheita a clientela elogiava o novo sabor das laranjas dizendo que tinham sabor diferente das outras, e todos queriam saber o que Henri havia usado para adubar a terra e deixar as laranjas tão saborosas.
Quanto à Helena, ela nunca mais partiu, permanecendo ali para todo o sempre e fertilizando a plantação de Henri.





















sábado, 16 de novembro de 2013

Irmãos de sangue

Nicolas crescera junto da irmã de criação, Eulália, corriam pelos campos verdes, subiam em árvores, cultivavam os mesmos gostos por quase tudo, eles tinham apenas uma diferença. Nicolas não tinha a mesma saúde de Eulália. Enquanto a menina tinha bochechas rosadas, fôlego pra correr, e uma saúde invejável, Nicolas sofria com falta de ar, de ânimo e era portador de uma palidez que o deixava semelhante a um moribundo. 
A menina Eulália era alegre, dona de uma vivacidade exuberante e feliz. Corria velozmente atrás das borboletas, quando a noite chegava sentia sono e se acabava em sonhos na madrugada, enquanto o pequeno Nicolas sofria de insônia, até mesmo a comida parecia lhe pesar. Nicolas freqüentava os mais diferentes médicos, e nada era descoberto sobre sua doença misteriosa. Os anos passavam, e tudo seguia como a velha infância atormentadora a Nicolas.
Ambos cresceram, tornaram-se adolescentes, freqüentavam a mesma escola, Eulália tinha amigos, gostava de ler e tudo se saíra como a qualquer outro jovem com boa saúde. Nicolas era solitário e encontrava dificuldade nos estudos.
Aos poucos eles se tornavam como uma espécie de estranhos um ao outro. O mundo em que viviam já não parecia ser o mesmo, e Nicolas sentia-se cada mais só e perdido em meio à vida, que já desde a infância lhe era sombria.
Mais alguns anos se passaram e Eulália ingressara na faculdade, a jovem começara o curso de medicina, queria desvendar a cura para a misteriosa doença do irmão, descobrir meios onde pudesse ajudar as pessoas que sofriam de doenças enigmáticas, ela crescera num ambiente atordoado pela doença de Nicolas, e sabia o valor que era possuir boa saúde.
Turbulentos anos estavam por vir, a doença de Nicolas chegava a um ápice irreversível, onde já não se sabia mais como lidar com aquela situação delicada que a família compartilhara desde seu nascimento.
Eulália dedicava-se aos estudos e pesquisava incessantemente para tentar encontrar uma solução para o irmão quase moribundo. A jovem acreditava que a misteriosa doença do irmão pudesse estar relacionada ao seu sangue, então tendo isso como um princípio para sua busca, iniciara uma investigação de doenças hematológicas. Eulália tinha o auxílio de seu mentor, um futuro ancião apaixonado pela medicina e pela cura. Fizeram alguns testes utilizando vários tipos sanguíneos e decidiram conglomerar e ver o que acontecia juntamente com o sangue de Nicolas.
Nicolas fora submetido à inúmeras inoculações sanguíneas, depois de um tempo sendo cobaia, as coisas começavam a mudar e Nicolas já parecia mais forte, corado, aos poucos foi melhorando. Porém aquele estágio de tratamento não durara muito tempo, assim que as dosagens de medicamentos iam diminuindo os velhos sintomas retornavam lentamente ao corpo de Nicolas. Já não se sabia mais o que fazer, como proceder com tal situação de desconforto e desespero.
Nicolas oscilava entre a casa da família e hospitais, os sintomas não cessavam, mas mesmo assim Eulália estava sempre buscando novas alternativas para a possível cura do irmão.
Entre idas e vindas, submissões à medicina, sendo cobaia e tendo o corpo totalmente perfurado por agulhas Nicolas reagiu agressivamente dando um basta aquilo e pediu que o deixassem morrer em paz, na casa da família, onde lá ele teria sossego, não sentiria tais dores devido ao tratamento que o torturava. Já em estado de debilidade profunda, e sem forças para aguentar ainda o tratamento experimental, os pais de Nicolas acataram seu desejo, já interpretando como o último. Então desde que Nicolas estava decididamente certo de que não sairia mais de casa, ao menos seu humor melhorou, o jovem sentiu-se descansado, pois já tinha chegado ao ápice aquela tortura cuja qual fora submetido pela futura médica Eulália.
Em uma manhã de domingo Eulália como de costume veio visitar a família, trazendo gostosuras da cidade e chegando ao campo colhera flores para alegrar a velha casa moribunda da família. Entrou em casa, beijou o pai, beijou a mãe, cumprimentou os empregados, colocara as flores na água e fora até o quarto mórbido de Nicolas, chegando lá encontrara o garoto dormindo em um sono profundo, que até parecia estar dormindo há uns cem anos. Eulália o cutucara, falou algumas palavras mas nada de Nicolas acordar. Então quando a jovem deu as costas à cama do irmão ele lançou sobre ela uma flecha que a acertou em cheio, Eulália teve os pulmões perfurados e a fecha atingira também o seu coração. Ela caiu morta ali mesmo em poucos segundos e Nicolas conseguira morrer em paz.









domingo, 4 de agosto de 2013

A loucura: "Nunca jogue xadrez com a morte"

Era uma noite bonita e estrelada, o brilho da lua ofuscava os olhos de quem a olhasse. Ele, não se sentia bem, parou por horas e ficara olhando para o vazio, muitas perguntas ao amplo infinito, mas sem nenhuma resposta.
Decidira deitar-se entre a velha bagunça, da qual não se desfazia e tentar adormecer, mas o sono não vinha, tamanho era seu desgosto, que, nem ao menos dormir sentia-se capaz, usou alguns artifícios para que ao menos isso, conseguisse fazer.
Só assim, com ainda muita dificuldade conseguira entranhar no mundo dos sonhos, onde a vida era acessível e ilusória.
Fez-se o dia, o sol escaldante, fazia com que as pessoas caminhassem pelas ruas feito moribundas. Ele não se animara a sair nem ao menos para comprar pão e leite, já há tempos também não acompanhava o noticiário pelo jornal, hábito antigo que abandonara.
Antigamente, tinha hábitos que faziam sentido, colhia flores pela manhã, passava o café e lia o jornal com as notícias locais, mantinha-se informado a respeito dos acontecimentos locais, cultivava algumas amizades,reunia alguns parceiros de jogatina semanalmente, tinha um cardápio alimentar bem incrementado, usando legumes cultivados por ele em sua pequena horta. Nada mais disso existia, é como se todos estes velhos costumes tivessem abandonado-o, deixando-o frívolo e desencantado com a vida.
O mundo a ele se tornara hostil, inabitável, e por conseqüência desinteressante, tudo o que via eram velhos muros cinzas, árvores velhas e podres, um céu sem nuvens e jardins mórbidos, exalando um perfume mortífero, e com aspecto cadavérico.
A terra era seca e improdutiva, de onde nenhum sonho poderia brotar. O niilismo se apossava daquela velha alma, que de jovem passava a anciã, como num piscar de olhos.
Um sopro lhe chegava ao ouvido, perguntava-se havia enlouquecido, deste sopro gélido palavras nebulosas adentravam seus tímpanos, causando sensação de loucura imediata. Fora tomado de compulsão neste instante, levando-o ao isolamento crônico em sua casa doente. Já não saia, não comia, nem bebia, tampouco dormia, vozes o atormentavam, gritos vindos do além, visões fantasmagóricas, era o ápice. Estava comprovado, a loucura tomara seu corpo, e o tirava da realidade negativamente inebriante.
E dias após dia, aquela sensação de insanidade invadia sua mente que devido a sua instabilidade física e psicológica. Sua saúde não era a mesma e ele não sabia como lidar com aquilo, então afastara-se do mundo, das pessoas dos amigos, mantinha apenas um fiel empregado que cuidara dele com zelo e preparava-lhe os alimentos.
A casa parecia mais um mausoléu a qualquer outra coisa. Tinha características anormais e indefinidas, se diferenciava das demais, era afastada, construída pelos seus antepassados, carregava uma atmosfera densa e inquietante, poderia-se se dizer que ela tinha vida e personalidade. O mordomo era a única peça que se encontrava em estado vivo na velha mansão dos Lönhorff.
Numa tarde desprezível onde Carlos mergulhava em delírios escaldantes, anunciara uma tormenta, repentinamente o céu fora coberto por nuvens acinzentadas carregadas de pessimismo, o vento gemia aos quatro cantos da velha casa, o mordomo fechara os poucos orifícios que ainda se encontravam entreabertos. A casa tremia constantemente, foi quando então Carlos avistara ao longe um cavalo negro de pelos tão brilhantes quanto um diamante, pensara consigo quem poderia ser, há muito tempo não recebia visitas e nem fazia questão de ser anfitrião de quem quer que seja.
O cavalo se aproximou da mansão e o cavalheiro distinto descera com sutileza e elegância há tempos não vista pelas redondezas. Aproximou-se da casa subindo a íngreme escada de pedras e cumprimentou o velho amigo, Carlos demorara para reconhecer o inseparável parceiro de sua doce infância, sentiu por um instante um raio de felicidade instantânea ao reconhecer o velho e nobre amigo.
Alberto fora convidado a adentrar à casa e partilhar de uma ceia em homenagem à sua ilustre visita, então o mordomo começara a preparar o banquete, as flores, a bebida, as velas e todo o resto. Enquanto isso Carlos e Alberto resguardavam-se na biblioteca da mansão, e conversavam sobre o tempo, a infância, os acontecimentos, o desaparecimentos de suas famílias e o afastamentos dos amigos.
Carlos abrira um velho vinho para celebrar a nobre visita do amigo enquanto fumavam charutos e jogavam uma partida de xadrez até que o jantar ficasse pronto, relembraram dos tempos onde aprenderam e colocavam em prática o jogo, e sempre apostavam qual sabia mais e qual ganharia a partida. E assim foram-se algumas horas conversando e jogando, até que o jantar fora servido e os velhos amigos partilhavam aquela ceia sublime.
Logo após o jantar seguiram bebendo e jogando o velho xadrez, com seus quadrados já desbotados pela ação do tempo, a tormenta parecia acalmar-se, a chuva caia e era como música para aquele momento tão peculiar, as velas ameaçavam apagar-se de tempos em tempos por causa do vento que adentrava a mórbida casa e o jogo começava a ganhar um tom de seriedade.
As lembranças de antigas jogatinas refrescou a memória de Alberto enquanto Carlos continuava concentrado em suas estratégias a fim de ganhar o jogo. Então na medida que moviam as peças, Alberto ia acrescentando uma nova velha lembrança acerca das antigas jogatinas. 

O passado cada vez mais se aproximava daquela noite onde os amigos celebravam o reencontro e relembravam acontecimentos antigos. A cada peça movida, uma recordação se opunha durante aquela partida de xadrez. As horas passaram e já era madrugada, foi quando Alberto retirou-se da biblioteca e retornou com um machado e assim dando fim ao jogo.




quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

O peso da existência




Existem coisas na vida que não nos damos conta, tamanha é a sutileza que acabamos por não perceber determinados acontecimentos na vida.
Acredito cautelosamente que existe uma grande diferença entre viver e existir. Existir todos existimos, para que o primeiro verbo se manifeste, precisamos antecipadamente do segundo. Pois bem, penso que muitas pessoas, para não dizer a maioria delas, apenas existem, e em momentos fracionários vivem.
A existência nada mais é que um fardo, um grande peso que carregamos nas costas, que empurramos para o cume da montanha, sendo este um caminho íngreme e um trabalho árduo. É como carregar uma grande pedra sobre nossas cabeças. E o mesmo ocorre conosco em relação ao planeta. Pesamos sobre a terra e carregamos um peso sobre nós.
Existir é tão fácil, mas e  viver? Quem se sente vivo na maioria do tempo? Quem não sente o peso da existência sobre os ombros?
Podemos nos iludir e crer que a vida é bela e mágica, muito boa, e por vezes até é. Nada é tão ruim e ou tão bom que dure para sempre. Tudo é tão efêmero, a vida passa feito um furacão perante nossos olhos e muitas vezes nem conseguimos acompanha-lo por muito tempo, e assim some no horizonte.
Existir é um verbo dolorido, nos deixa enfadonhos e demasiadamente fracos, sonolentos e sem fé. Fé na vida, no futuro, na humanidade e principalmente em nós mesmos.
Eu até ousaria a mudar o questionamento feito por Sartre, ao invés da condenação à liberdade (qual liberdade?), deste modo penso que estamos condenados à existir.
Viver é um ato que cabe a poucos, existir cabe a todos. Quem realmente sente-se vivo?

quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

Chá das "cinco"

Era um fim de tarde de uma sexta-feira qualquer, ele caminhava a passos lentos, usava um terno preto, camisa azul escuro e um chapéu também de cor preta. Tinha a face rosada e olhos azuis e um ar misterioso. De repente parou de caminhar e ficou em pé na parada de ônibus, acendeu um cigarro e lentamente o consumia. O ônibus chegou e ele continuava imóvel no mesmo lugar. Ele esperava sua amada que viria de um canto qualquer da grande cidade acinzentada que neste fim de tarde se encontrava um pouco menos cinza que o habitual. O cinza era devido à fumaça poluente das fábricas que por ali estavam instaladas, o fim de tarde era menos cinza porque era sexta-feira e por dois dias as fábricas fechavam. Era menos cinza porque seus trabalhadores paravam e poderiam usufruir dois dias de descanso.
Mais um ciclo semanal se fora. Mas voltando ao nosso protagonista, apesar da cara avermelhada devido ao álcool ainda tinha boa aparência. Reconhecendo-o de alguns poucos anos atrás, podia perceber que tinha um charme peculiar, parecia ter rejuvenescido, porém continuava a se deleitar aos prazeres do álcool. Tinha mulher, filhos e um bom trabalho. Os colegas do departamento diziam que era um bom homem, mas que estava em estado de perdição. Falavam que a bebida em excesso o consumia e não ele a ela.
As pessoas mudam, envelhecem, rejuvenescem, se entregam aos vícios, eliminam- os. Iniciam romances, encerram-os.
Ciclos e ciclos meu caro, eis a catástrofe da vida etérea. O que não podia deixar de notar era o ocorrido no fim da tarde de uma sexta-feira qualquer.