sábado, 15 de março de 2014

O retorno

Era uma noite fria e chuvosa, o pessoal já havia ido para casa, era sexta-feira e todos ansiavam pela noite que antecedia o final de semana, exceto Eldon, um cientista fissurado pelo trabalho, um apaixonado pelas pesquisas laboratoriais e visto como um insano por muitos. Eldon acreditava no poder da mutação, levava suas pesquisas extremamente a sério e não abandonava o desejo de conseguir provar que estava certo em relação a isso. Eldon tinha uma teoria depois de longos anos de estudo de que  poderia transmutar vírus, estados psíquicos e doenças de um corpo para outro e posteriormente remover a doença do corpo doente e adormece-lo em um tubo de ensaio e mantê-lo lá eternamente.
Dias antes Eldon havia feito uma grande encomenda de ratos, ele tinha por meta ultrapassar seus limites e aperfeiçoar sua pesquisa onde buscava comprovar que era possível retirar uma doença de um corpo e transferi-la para outro corpo, curando assim o primeiro e adoecendo o segundo.
Pois bem, Eldon tinha uma irmã doente, extremamente doente cuja cura estava distante da medicina convencional, então ele passou a se dedicar profundamente em sua pesquisa a fim de cura-la.
E assim o fez. Naquela noite de sexta-feira chuvosa onde seus colegas se encontravam em seus recintos, em festas e bares da cidade, Eldon aproveitou que o laboratório ficaria livre somente para ele e trouxe sua irmã até o local, depois de meses de pesquisa, testes com animais, Eldon achou que estava na hora de contribuir com a saúde da irmã e igualmente com a medicina.
Chegando ao laboratório raios e trovões amedrontavam a cidade, o céu estava escuro e a chuva caia incessantemente. Eldon a carregou em seus braços até a sua sala acomodando-a em uma cadeira com fios elétricos que se interligavam à grande tempestade, outros fios ligados à energia elétrica do local. Anexou ao corpo da irmã todos estes fios de eletrodos e a deixou ali por um instante. Enquanto isso ele pegou um dos ratos do laboratório e agregou fio a fio que estava já em contato com o corpo doente da irmã ao pequeno corpo do rato. Depois de pronto sentou e aguardou relampejos e luzes vivas ao céu.
Algumas horas se passaram e tudo seguia normalmente e de modo pacato. As horas iam passando, e o relógio marcava 10 para a meia noite, então um grande raio se fez presente deixando o laboratório azul ofuscantemente vivo, os fios começavam se dissipar, correntes elétricas explodiam em uma simbiose perfeitamente harmônica e vulnerável ao poder atômico começava ultrapassar todos os limites do jovem cientista.
Todo o seu controle estava agora longe de seu alcance e ele perdera todas as suas cartas do jogo e já não tinha mais como saber o que de fato estava ocorrendo. Algumas horas se passaram e Eldon adormeceu.
Quando desperto na manhã seguinte se encontrava solitário em seu laboratório, começara vasculhar o local procurando pela irmã e o rato. Visto que a irmã não caminhava, o que teria acontecido a ela depois da experiência, preocupou-se, mas sentia-se demasiadamente excitado ao perceber a ausência de ambos ali no local. Depois de uma busca frenética e incessante cansou e foi para casa, nada poderia fazer até o exato momento.
No sábado à noite Eldon aceitara o convite de amigos para sair beber, passou horas na rua bebendo com os amigos e se embriagara a tal ponto de esquecer a experiência da noite anterior. Ele estava transtornado demais para lembrar-se de qualquer coisa, sua mente já estava exausta e ele exaurindo álcool pelos poros.
Quando retornou ao lar, abriu a porta devagar, tentou acender as luzes, o que fora impossível, a casa encontrava-se desprovida de energia elétrica, então Eldon adentrou o recinto, subira até o sótão e adormecera.
Naquela madrugada Eldon fora surpreendido por um grande rato falante, o rato o surpreendera no momento sublime de sono agudo. Eldon despertara assustado com a voz grave do rato o questionando a respeito da experiência, primeiramente Eldon atribuiu o ‘insight’ ao álcool ingerido na noite que antecedia aquele momento relativamente grotesco para si. E o rato com ar irônico afirmara:
-Isto não é um sonho, tampouco um pesadelo, eu existo, eu falo, eu estou conversando com você.
Eldon coçou a cabeça, arregalou os olhos em direção ao rato e nada disse, as palavras lhe faltavam naquele instante que o possuía lentamente até que desmaiasse e caísse então em sono profundo novamente.
O rato ali permaneceu e aguardara até o momento em que Eldon naturalmente despertasse. Isso levou algumas horas que não incomodaram a aberração criada pelo cientista, que agora sim concordava com os colegas de trabalho de que sim, de que teria enlouquecido.
Eldon tentou fugir, tentou abandonar a casa, mas fora impedido pelo rato que queria uma explicação. Então Eldon buscou acalmar-se e tentar uma possível resposta para o grande roedor, e disse-lhe:
-Eu o criei. Eu o fiz, porém não me pergunte como isso ocorreu, eu só queria curar minha irmã doente, queria transferir sua doença para si, desejava isso mais que qualquer outra coisa. Eu ia retirar todo o mal de seu pobre corpo pequeno e peludo, mas isso fugira de meu controle e agora nada mais posso fazer.
O roedor ouviu com atenção e o intimou para que fossem ao laboratório, e assim foi. Eldon cedeu ao pedido do rato, já que não tinha outra escolha se não esta e então foram. Chegando lá Eldon ainda sentindo-se embriagado tentando manter-se tranquilo e sensato mostrou como foi feita a experiência, era o que o rato queria saber.
Então o forte rato o amarrara na mesma cadeira, o amordaçara e capturara a doença de sua irmã salva em um tubo de ensaio e ligou a ‘máquina’ e transferiu o grande mal para o cientista. O rato agora se sentira vingado e a passos lentos caminhara rumo à vida humana.