domingo, 4 de agosto de 2013

A loucura: "Nunca jogue xadrez com a morte"

Era uma noite bonita e estrelada, o brilho da lua ofuscava os olhos de quem a olhasse. Ele, não se sentia bem, parou por horas e ficara olhando para o vazio, muitas perguntas ao amplo infinito, mas sem nenhuma resposta.
Decidira deitar-se entre a velha bagunça, da qual não se desfazia e tentar adormecer, mas o sono não vinha, tamanho era seu desgosto, que, nem ao menos dormir sentia-se capaz, usou alguns artifícios para que ao menos isso, conseguisse fazer.
Só assim, com ainda muita dificuldade conseguira entranhar no mundo dos sonhos, onde a vida era acessível e ilusória.
Fez-se o dia, o sol escaldante, fazia com que as pessoas caminhassem pelas ruas feito moribundas. Ele não se animara a sair nem ao menos para comprar pão e leite, já há tempos também não acompanhava o noticiário pelo jornal, hábito antigo que abandonara.
Antigamente, tinha hábitos que faziam sentido, colhia flores pela manhã, passava o café e lia o jornal com as notícias locais, mantinha-se informado a respeito dos acontecimentos locais, cultivava algumas amizades,reunia alguns parceiros de jogatina semanalmente, tinha um cardápio alimentar bem incrementado, usando legumes cultivados por ele em sua pequena horta. Nada mais disso existia, é como se todos estes velhos costumes tivessem abandonado-o, deixando-o frívolo e desencantado com a vida.
O mundo a ele se tornara hostil, inabitável, e por conseqüência desinteressante, tudo o que via eram velhos muros cinzas, árvores velhas e podres, um céu sem nuvens e jardins mórbidos, exalando um perfume mortífero, e com aspecto cadavérico.
A terra era seca e improdutiva, de onde nenhum sonho poderia brotar. O niilismo se apossava daquela velha alma, que de jovem passava a anciã, como num piscar de olhos.
Um sopro lhe chegava ao ouvido, perguntava-se havia enlouquecido, deste sopro gélido palavras nebulosas adentravam seus tímpanos, causando sensação de loucura imediata. Fora tomado de compulsão neste instante, levando-o ao isolamento crônico em sua casa doente. Já não saia, não comia, nem bebia, tampouco dormia, vozes o atormentavam, gritos vindos do além, visões fantasmagóricas, era o ápice. Estava comprovado, a loucura tomara seu corpo, e o tirava da realidade negativamente inebriante.
E dias após dia, aquela sensação de insanidade invadia sua mente que devido a sua instabilidade física e psicológica. Sua saúde não era a mesma e ele não sabia como lidar com aquilo, então afastara-se do mundo, das pessoas dos amigos, mantinha apenas um fiel empregado que cuidara dele com zelo e preparava-lhe os alimentos.
A casa parecia mais um mausoléu a qualquer outra coisa. Tinha características anormais e indefinidas, se diferenciava das demais, era afastada, construída pelos seus antepassados, carregava uma atmosfera densa e inquietante, poderia-se se dizer que ela tinha vida e personalidade. O mordomo era a única peça que se encontrava em estado vivo na velha mansão dos Lönhorff.
Numa tarde desprezível onde Carlos mergulhava em delírios escaldantes, anunciara uma tormenta, repentinamente o céu fora coberto por nuvens acinzentadas carregadas de pessimismo, o vento gemia aos quatro cantos da velha casa, o mordomo fechara os poucos orifícios que ainda se encontravam entreabertos. A casa tremia constantemente, foi quando então Carlos avistara ao longe um cavalo negro de pelos tão brilhantes quanto um diamante, pensara consigo quem poderia ser, há muito tempo não recebia visitas e nem fazia questão de ser anfitrião de quem quer que seja.
O cavalo se aproximou da mansão e o cavalheiro distinto descera com sutileza e elegância há tempos não vista pelas redondezas. Aproximou-se da casa subindo a íngreme escada de pedras e cumprimentou o velho amigo, Carlos demorara para reconhecer o inseparável parceiro de sua doce infância, sentiu por um instante um raio de felicidade instantânea ao reconhecer o velho e nobre amigo.
Alberto fora convidado a adentrar à casa e partilhar de uma ceia em homenagem à sua ilustre visita, então o mordomo começara a preparar o banquete, as flores, a bebida, as velas e todo o resto. Enquanto isso Carlos e Alberto resguardavam-se na biblioteca da mansão, e conversavam sobre o tempo, a infância, os acontecimentos, o desaparecimentos de suas famílias e o afastamentos dos amigos.
Carlos abrira um velho vinho para celebrar a nobre visita do amigo enquanto fumavam charutos e jogavam uma partida de xadrez até que o jantar ficasse pronto, relembraram dos tempos onde aprenderam e colocavam em prática o jogo, e sempre apostavam qual sabia mais e qual ganharia a partida. E assim foram-se algumas horas conversando e jogando, até que o jantar fora servido e os velhos amigos partilhavam aquela ceia sublime.
Logo após o jantar seguiram bebendo e jogando o velho xadrez, com seus quadrados já desbotados pela ação do tempo, a tormenta parecia acalmar-se, a chuva caia e era como música para aquele momento tão peculiar, as velas ameaçavam apagar-se de tempos em tempos por causa do vento que adentrava a mórbida casa e o jogo começava a ganhar um tom de seriedade.
As lembranças de antigas jogatinas refrescou a memória de Alberto enquanto Carlos continuava concentrado em suas estratégias a fim de ganhar o jogo. Então na medida que moviam as peças, Alberto ia acrescentando uma nova velha lembrança acerca das antigas jogatinas. 

O passado cada vez mais se aproximava daquela noite onde os amigos celebravam o reencontro e relembravam acontecimentos antigos. A cada peça movida, uma recordação se opunha durante aquela partida de xadrez. As horas passaram e já era madrugada, foi quando Alberto retirou-se da biblioteca e retornou com um machado e assim dando fim ao jogo.